Uma aplicação para o Salmo 121

Roberto Vargas Jr.
5 min readNov 9, 2022

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Eu havia preparado um material para um pequeno estudo que não vai mais acontecer.

Para o estudo, achei que seria relevante repetir estas coisas tão óbvias, por conta e diante de nosso contexto político nacional.

Para as obviedades não ficarem perdidas, segue uma transcrição do que eu desejava falar:

Salmo 121:

Elevo os meus olhos para os montes: de onde me virá o socorro?

O meu socorro vem do Senhor, que fez o céu e a terra.

Ele não permitirá que os seus pés vacilem; não dormitará aquele que guarda você.

É certo que não dormita, nem dorme o guarda de Israel.

O Senhor é quem guarda você; o Senhor é a sombra à sua direita.

De dia não lhe fará mal o sol, nem de noite, a lua.

O Senhor guardará você de todo mal; guardará a sua alma.

O Senhor guardará a sua saída e a sua entrada, desde agora e para sempre.

Este é um dos salmos de romagem, cantados quando Israel realizava sua peregrinação para adorar o Senhor em Sião.

Os dois primeiros versos são significativos para o rumo do salmo. Mas antes de irmos a eles, uma digressão, com um texto que escrevi recentemente.

Sei que o clima político nacional é apocalíptico e (ainda) não é para isso tudo. Mas é inevitável alimentar meu pessimismo amilenista.

Então lembrei da “longa derrota” de Tolkien: “Na verdade, eu sou um cristão e, de fato, um católico romano, de modo que não espero que a ‘história’ seja nada além de uma ‘longa derrota’ — embora contenha (e em uma lenda possa conter de forma mais clara e comovente) algumas amostras ou vislumbres da vitória final.”

Ele também colocou esta “longa derrota” na boca de Galadriel: “[…]e eu já morei com ele por anos sem conta; antes da queda de Nargothrond ou Gondolin, eu atravessei as montanhas, e juntos, através de eras do mundo, combatemos a longa derrota.” (p.372 — A Sociedade do Anel — Volume Único 2003)

Para os elfos, quer Sauron saísse vitorioso ou derrotado, seria um fim amargo. Pois até mesmo com o fim do Um Anel, as obras dos anéis élficos feneceriam, e a eles restaria ir a Valinor ou perecer em luto na Terra-Média.

Mesmo neste contexto de “fim do mundo”, eles se põem a lutar — ao custo de suas próprias vidas — para que os homens herdem seu lar.

E isto, por sua vez, faz lembrar Chesterton.

Chesterton menciona em Ortodoxia a diferença essencial entre o suicida e o mártir. Para ele, enquanto a morte do suicida é, por assim dizer, matar tudo mais, a morte do mártir é tal que tudo mais siga a viver. Um declara o fim. O outro a renovação. É morte versus redenção.

Bem, já ouvi a acusação de que meu pessimismo faria com que eu me prostrasse, derrotado, diante da história. Tolice!

Ainda que lutar a “longa derrota” seja uma fonte inesgotável de tristeza, ainda há beleza antes, durante e depois. Principalmente depois.

Porque me prostro sim. Não, porém, derrotado. Nem diante da história. Prostro-me diante do Cristo, que no tempo foi crucificado, mas ressuscitou. E que, Soberano Senhor, Rei dos reis e Senhor dos senhores, virá para a vitória final e eterna.

Louvado seja Ele!

Voltemos ao salmo.

O primeiro verso menciona os montes. “Elevo os meus olhos para os montes”. Por quê?

Em certo comentário lemos que os montes representavam proteção aos israelitas em sua peregrinação. Eis, pois, a razão de ser significativo: elevo meus olhos aos montes e neles confio a minha segurança? Confio minha paz em qualquer circunstância da minha vida: meus bens e dinheiro, a lei dos homens, os líderes políticos?

Está claro que, se em qualquer contingente depositarmos nossa esperança, estamos perdidos. Os líderes políticos nos traem, a lei dos homens é injusta, bens e dinheiro acabam… os montes podem ser transpostos.

Então, “de onde me virá o socorro?”

Louvado seja o Senhor, que fez o céu e a terra, que nos guarda sem descanso, dia e noite nos livra do mal e que, desde agora e para sempre nos reserva para Si.

Não é, pois, no meu olhar pessimista que está minha confiança. Não são os horrores do tempo, os — de certo modo leves horrores — que já estão aí e os — bastante preocupantes — que podem vir, que me poderão realmente abalar. Não são bons ou maus governantes que me farão me prostrar. Não importa o “clima apocalíptico” que se instaure ao meu redor. Não servimos à história, não servimos à “longa derrota”. Servimos à vitória final, servimos ao Cordeiro que a conquistou!

“O meu socorro vem do Senhor”, louvado seja Ele para sempre!

Segue também o comentário de Matthew Henry sobre o salmo 121, que é bastante apropriado:

A segurança dos santos.

Não devemos depositar a nossa confiança nos homens, nem nos meios, instrumentos e causas secundárias. Dependerei da força dos montes? Dos príncipes e dos grandes homens? Não! A minha confiança está unicamente em Deus. Antes, devemos levantar os nossos olhos acima dos montes; devemos contemplar o Deus que faz com que todas as coisas terrenas sejam o que realmente são para nós. Devemos ter todo o nosso socorro em Deus, esperá-lo dEle a seu próprio tempo, a seu modo.

Este salmo ensina-nos a consolarmo-nos no Senhor, quando as dificuldades e os perigos forem maiores. A sabedoria onipotente é a que planeja; e força onipotente é a que garante a segurança dos que se colocam sob a proteção de Deus. O Senhor é o que guarda de tal maneira que permanece ativo e vigilante; Ele jamais se esgota; jamais adormece; nem sequer cochila. sob esta sombra podemos nos sentar e dormir seguros. Ele está sempre próximo ao seu povo, para a proteção e renovação deste.

A destra é a mão que trabalha; tornem-se aos seus deveres, e encontrarão um Deus preparado para prosperá-los. Ele cuida para que o seu povo não caia. Não seremos feridos por ataques diretos, nem pelos intentos secretos dos nossos inimigos. O Senhor impedirá o mal que tememos e santificará, eliminará ou esclarecerá o mal que porventura sentirmos. Ele preservará a alma para que não seja contaminada pelo pecado, nem perturbada pela aflição; preservá-la-á para que não pereça eternamente. Ele nos sustentará na vida e na morte; quando sairmos aos nossos afazeres na manhã de nossa vida, e ao regressarmos à nossa casa, ao nosso repouso, quando o crepúsculo da velhice nos chamar a entrar. Esta é uma proteção vitalícia. O Espírito Santo, que é o nosso preservador e Consolador, habitará para sempre conosco. Que sejamos encontrados na realização da nossa obra, seguros de que as bênçãos prometidas neste salmo são nossas.

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