Para minha maninha

Roberto Vargas Jr.
3 min readSep 17, 2021

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Escrevi este texto em 25 de julho de 2012, no meu antigo blog. Minha irmã tinha acabado de fazer uma tatuagem com uma fênix e perguntou o que achei. Eu disse que tinha umas palavrinhas a dizer e as diria por escrito. Aqui eu faço pequena modificação, para adequá-lo ao que penso já quase dez anos depois.

Um dos pais da Igreja, Clemente de Roma, escreveu aos coríntios já para o final do primeiro século[1]:

Vejamos o estranho sinal que se verifica nas regiões do Oriente, isto é, nas regiões da Arábia. Aí existe um pássaro ao qual dão o nome de fênix. É o único na sua espécie, e vive quinhentos anos. Quando está para morrer, faz para si o ninho de incenso, mirra e outras plantas aromáticas, no qual, chegada a hora, entra e aí morre. Da carne em putrefação nasce um verme que, nutrindo-se com os humores do animal morto, cria asas. Depois, ao adquirir força, pega o ninho onde jazem os ossos de seu antepassado e, carregando-o, vai da região da Arábia para o Egito, até o lugar de Heliópolis. De dia, aos olhos de todos, voando até o altar do sol, depõe aí o ninho e a seguir retorna para o lugar de onde veio. Os sacerdotes consultam os anais e constatam que ele chegou ao se completarem quinhentos anos.

Portanto, será que vamos julgar coisa grande e extraordinária que o Criador do universo ressuscite aqueles que o serviram santamente na confiança da fé sincera, se mediante um pássaro ele nos mostra a grandeza do que anunciou?

Certamente é um discurso que nos soa hoje bastante ingênuo. Em tempos “iluminados” por uma “razão emancipada da fé”, não há qualquer força no argumento que usa um mito como prova da ressurreição. Ao contrário, tal discurso soa ao espírito hodierno como uma lenda querendo ser prova de outra.

Porém, se deixamos de olhar para o discurso como argumento e passamos a entende-lo como o que é, um mito, então esta passagem da carta se torna mais bela. Pois um mito será sempre uma narrativa fantástica - real ou fantasiosa - que aponta para uma verdade. E a verdade em questão é a morte deste corpo e a ressurreição para a vida eterna em Cristo Jesus.

Lembre-se: Cristo, o Filho, o Verbo Encarnado, é o Mito que encontra a História. É, por assim dizer, o Mito dos mitos, aquele para o qual todos os outros apontam!

Que a fênix não seja a prova que não é, mas que seja um símbolo da esperança que há em nós, uma forma de ação de graças. E que então faça sentido o preâmbulo da história que se conta:

Caríssimos, consideremos como o Senhor nos manifesta sem cessar a ressurreição futura, cujas primícias ele as concedeu no Senhor Jesus Cristo, ressuscitando-o dos mortos.

Não sei que intenção se passa em seu coração, mas gostaria que considerasse estas palavrinhas. Então a imagem, que é bela, passará a me parecer ainda mais bela.

Deus te abençoe, maninha!

[1] As citações sãoda Primeira Carta de Clemente aos Coríntios, a primeira de 25.1–5 e a segunda de 24.1.

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